27 de Novembro de 2015 - 15h:28

Tamanho do texto A - A+

Gigante internacional, Abengoa pede para entrar em recuperação judicial

Por: ConJur

A empreiteira espanhola Abengoa pediu recuperação judicial nesta quarta-feira (25/11). Caso a situação não seja revertida, o grupo, que tem negócios de infraestrutura e energia renovável em todo o mundo, pode protagonizar a maior falência da história da Espanha, segundo agências internacionais de notícias. A exposição dos credores ao impacto é calculada em 27,4 bilhões de euros, sendo 80% do passivo com instituições financeiras internacionais. São mais de 5 bilhões de euros em dívidas com fornecedores. A lista dos maiores credores chega a 200 empresas. O passivo judicial do grupo espalha-se pelos cinco continentes. 

Com efeitos semelhantes aos do processo de recuperação judicial brasileiro, o “pedido preliminar de proteção contra credores” feito nesta quarta (25/11) dá à empresa quatro meses de carência contra cobranças, enquanto negocia com credores, de acordo com o advogado especialista em recuperações judiciais Guilherme Marcondes Machado, do escritório PLKC Advogados.

 “Ao requerer o ‘pre-concurso de acreedores’ com base na Ley 22/2003, o devedor terá um prazo de três meses para negociar com seus credores e apresentar um plano de recuperação, que deverá ser aprovado por detentores de no mínimo três quintos dos créditos sujeitos ao processo”, explica o advogado. “A lei espanhola garante a proteção (stay period) por quatro meses. O objetivo é a manutenção das atividades do devedor e o afastamento do estado de insolvência com a renegociação do passivo.”

A dívida bruta da empresa registrada no terceiro trimestre foi de 8,9 bilhões de euros. 

No fechamento da Bolsa de Madri, as ações da companhia registraram queda de 53,85%. Ao longo do dia, chegaram a cair 69,21%. Com as quedas, o valor de mercado da companhia despencou para 300 milhões de euros.

 A Abengoa foi fundada em 1941, em Sevilha, para montagens elétricas. Na década de 1960, começou a se internacionalizar. Hoje, tem em torno de 24 mil trabalhadores, em 80 países. Seus principais mercados são Espanha, Brasil e Estados Unidos. Sua maior acionista é a Inversión Corporativa, de propriedade da família Benjumea, do fundador da Abengoa. Até o fim de 2014, ela tinha 51,63% das ações, de acordo com os jornais portugueses Público e Negócios

Segundo comunicado distribuído pela empreiteira, o gatilho para o pedido de recuperação foi o recuo do grupo Gonvarri Corporación Financiera, filiado ao Gestamp, no plano de investir 350 milhões de euros em troca de 28% do capital da Abengoa. Como outros bancos se negaram a abrir linhas de crédito de 1,5 bilhão de euros, o Gonvarri teve de desistir, segundo a Reuters

"A companhia continuará com o processo de negociação com as suas entidades credoras com a finalidade de alcançar um acordo que garanta a viabilidade financeira", diz o comunicado. 

De janeiro a setembro, a companhia registrou perdas de 194 milhões de euros, segundo a agência EFE. No último dia 13 de novembro, a empresa de auditoria Deloitte alertou, em relatório entregue juntamente com o resultado trimestral da Abengoa, para “dúvidas significativas” sobre a viabilidade econômica da Abengoa, por conta da dificuldade em tomar novos empréstimos e renegociar os atuais. O mesmo informe de resultados deu conta de 11,5 milhões de euros pagos a Felipe Benjumea como indenização por ter deixado antecipadamente seu mandato como presidente executivo da companhia. Até dezembro de 2016, o executivo receberá 1 milhão de euros anuais por serviços de assessoria, de acordo com o jornal espanhol El País

Com propriedades em diversas partes do mundo, a empresa cresceu alavancada pelo endividamento durante o último período de prosperidade espanhol, chegando ao posto de uma das líderes em construção de linhas de transmissão na América Latina, com grandes usinas de energia renovável nos Estados Unidos e na Europa. 

O estancamento espanhol nos subsídios nacionais foi o estopim para a derrocada, segundo análise do jornal britânico Financial Times. A reforma energética espanhola, ocorrida em 2013, cortou incentivos a fornecedores de energias renováveis, política que já durava anos.

 O maior credor da Abengoa é o banco Federal Financing Bank (FBB), controlado pelo governo americano, a quem a empresa deve 2,2 bilhões de euros. O banco financiou projetos de construção de centrais solares nos Estados Unidos. O segundo é o banco Santander, que tem 1,5 bilhão de euros a receber. O Banco Nacional de Desenvolvimento Social espanhol é o terceiro, com 750 milhões de euros em financiamentos de projetos de produção de etanol. Outros na lista de maiores são Bankia, Caixabank, Sabadell, Banco Popular e Bankinter. 

No Brasil, a empresa, que tem contratos com o governo federal para a renovação da rede de transmissão de energia entre os estados de Tocantins e Bahia, já anunciou o encerramento de suas atividades. Vários fornecedores e prestadores de serviços de Goiás, Tocantins, Piauí e Bahia souberam da notícia esta semana, e estão sem perspectivas de receber.  

Em 2007, o grupo adquiriu usinas de açúcar e álcool da brasileira Dedini Agro por mais de R$ 600 milhões. No entanto, o prejuízo líquido de R$ 152 milhões do investimento no ano passado e a falta de dinheiro na matriz fizeram com que a empresa não saldasse suas dívidas, culminando com protestos em cartório, execuções fiscais e até uma ação de despejo. O litígio está estacionado no Superior Tribunal de Justiça. 

O conflito já rendeu 43 recursos no Superior Tribunal de Justiça e seis no Supremo Tribunal Federal. Na Justiça do Trabalho, ela responde ainda a 42 processos em tribunais regionais do Trabalho de quatro estados e a 12 no Tribunal Superior do Trabalho. Nos tribunais regionais federais, que julgam cobranças tributárias e disputas envolvendo concorrentes em licitações, há 64 recursos. Fora outras ações nos tribunais de Justiça do Rio de Janeiro, Minas Gerais, Paraná e Rio Grande do Sul.

Nos Estados Unidos, o grupo espanhol enfrenta acusações de tráfico de influência, corrupção, clientelismo político e crimes contra o sistema financeiro. O reputado portal Townhall Finance, em reportagem sobre o grupo, resumiu de forma cáustica sua conclusão. Perguntou aos leitores: “Sabe como se diz ‘corrupção’ em espanhol?” — para responder, sem rodeios: “Abengoa”.

VOLTAR IMPRIMIR