30 de Abril de 2008 - 14h:34

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MP do governo ignora trabalho escravo, afirma Anamatra

Por: Consultor Jurídico

O projeto trabalhista do segundo mandato do presidente Lula não é bem visto pelos juízes do trabalho. A reforma da Consolidação das Leis do Trabalho e a Medida Provisória, que altera o regime de contratação temporária de trabalhadores rurais, foram duramente criticadas pelo juiz trabalhista Cláudio José Montesso, presidente da Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho (Anamatra) no discurso de abertura do congresso bienal da classe, em Manaus, na terça-feira (29/4). O evento recebeu o patrocínio do próprio governo e de empresas públicas federais (Caixa Econômica, Correios, Banco do Brasil e Petrobras).
Dos 2.919 juízes trabalhistas no país, 450 deles estão em Manaus até o dia 2 de maio para discutir o tema “O homem, o trabalho e o meio: uma visão jurídica e sociológica”.
Para Montesso, a MP 470/07, de dezembro passado, ignora a existência de mão-de-obra escrava na produção agrícola. Os juízes do Trabalho, segundo Montesso, não podem permitir que a política de biocombustíveis precarize as relações de trabalho em troca de um esforço para que o país se integre ao mundo desenvolvido. “Infelizmente não é o que se sinaliza nos dias de hoje”, afirma o juiz, lembrando que os biocombustíveis atualmente são apontados como o grande vilão pela alta dos preços dos alimentos.
Ele criticou o fato da MP ter sido enviada com tão descabida urgência por causa da sua relevância. A medida dá aos trabalhadores rurais contratados temporariamente o direito de serem registrados na previdência social. Negociações coletivas também podem prever a dispensa da anotação na carteira de trabalho.
“A idéia que é aplaudida de pé por quem está na linha de frente da defesa do latifúndio e que nega a existência comprovada de trabalho escravo e degradante entre nós”, disse Montesso. Nas plantações de cana-de-açúcar, principal insumo do biocombustível brasileiro, é praxe a contratação dos cortadores apenas para o período de safra.
Nova CLT
O Projeto de Lei 1.987/07, do deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP), também não agrada os juízes alinhados com a Anamatra. Montesso afirma que a proposta de nova CLT não chega em um momento propício porque o país passa por um dos maiores períodos de crescimento econômico “com a criação de 7 milhões de empregos”. Para ele, o projeto incorpora conceitos e definições arcaicas que estão superados pela jurisprudência. “Seus valores são os mesmos do período pré-revolução industrial, restaurando o princípio da autonomia das vontades, que nem mesmo o Código Civil admite mais”, ressaltou.
Para presidente da Anamatra, “o que causa ainda mais indignação e perplexidade é que as duas propostas, de claro perfil liberal, surgem das hostes do Partido dos Trabalhadores e do Governo dirigido pelo presidente operário”. O juiz chegou a dizer que é preferível acreditar que, diante de tamanhas aberrações jurídicas, tenha ocorrido o princípio da boa-fé. Para ele, as duas podem ter passado despercebidas pelo partido e pelo presidente. "O contrário seria reconhecer que ambos já não se importam com sua história ou com sua trajetória", afirmou.
Para os juízes trabalhistas, há um discurso dominante nos meios de comunicação de que o Direito do Trabalho atrapalha o desenvolvimento e de que a proteção deve ser eliminada para que, nas contratações de empregados, tudo seja permitido.
A categoria mostra que fincou o pé contra a flexibilização trabalhista. Por isso, Montesso disse que duas bandeiras a serem defendidas pelos juízes do Trabalho são: a ratificação da Convenção 158 da Organização Internacional do Trabalho e a regulamentação do inciso I do artigo 7º da Constituição. O primeiro item foi enviado recentemente ao Congresso pelo presidente Lula. Ele proíbe a demissão imotivada. Já a norma constitucional prevê uma indenização rescisória por despedida arbitrária.
“É preciso conscientizar a sociedade brasileira que não é mais possível conviver-se com relações de trabalho tão inconstantes, mostrar que o Brasil é campeão de rotatividade de mão-de-obra e que isso decorre do fato de que os empregadores consideram-se donos do emprego e do empregado, rompendo os contratos sem qualquer motivação ou apenas porque simplesmente o empregado exigiu o cumprimento das mais elementares obrigações ou recusou-se a cumprir tarefa que não lhe era destinada, ou então, porque o empregador não gosta mais do empregado”, disse Montesso.
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