09 de Maio de 2008 - 15h:43

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Judiciário adapta Lei de Greve a servidores

Fernando Teixeira, de Brasília

Por: Valor Online

As greves dos auditores fiscais e dos advogados da União estão servindo de tubo de ensaio para a nova posição do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre greves de servidores públicos, inaugurada em outubro de 2007. Pelo novo cenário, mesmo sem contarem com legislação própria, greves de servidores podem ser julgadas segundo a lei que rege o setor privado - a Lei nº 7.783, de 1989. Ainda há muitas adaptações a serem feitas, mas algumas respostas já começam a ser dadas pela Justiça. Entre as decisões já tomadas, estão entendimentos de que os dias parados não devem ser pagos, de que um acordo com o governo só é legítimo se já houver previsão orçamentária e o de que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem competência originária para julgar greves do funcionalismo federal.

Os primeiros parâmetros foram dados pelas decisões do ministro do Supremo Gilmar Mendes sobre a greve dos advogados da União, e do ministro do STJ Napoleão Nunes Maia Filho sobre a greve dos auditores fiscais. A maior expectativa recai sobre o julgamento do mérito da paralisação dos auditores fiscais, que aguarda uma decisão da terceira seção do STJ. Advocacia-Geral da União (AGU), sindicalistas e advogados de servidores estão acompanhando o caso, mas não há idéia sobre o possível resultado - e nem mesmo se o caso será julgado, confirmados os rumores de que a greve será encerrada na segunda-feira.

Gilmar Mendes, também relator do Mandado de Injunção nº 708, que declarou a aplicação da Lei de Greve do setor privado aos servidores públicos, julgou no início de abril um recurso da AGU contra a greve dos advogados públicos. O ministro entendeu que "não é razoável a exigência de implementação do acordo firmado em 11 de novembro de 2007 entre os advogados públicos federais e a União, tendo em vista a ausência de previsão orçamentária". Ele autorizou o corte de vencimentos, por ver a ocorrência de grave lesão à ordem pública, com a possibilidade de perda de prazos processuais e paralisação de licitações. Já o ministro do STJ Napoleão Nunes Maia Filho foi mais favorável aos grevistas, e só mudou de idéia quando a AGU levou ao ministro os precedentes proferidos pelo Supremo.

Segundo o presidente da Associação Nacional dos Advogados da União (Anauni), José Wanderley Kozima, a jurisprudência dos tribunais sempre foi favorável ao corte de ponto, mas em geral a decisão só vinha depois de encerrada a greve - ocorria, em geral, um acordo para a reposição dos dias parados com horas extras. Com a decisão de Gilmar Mendes, publicada em 15 de abril, os advogados voltaram imediatamente ao trabalho. Os auditores continuaram parados, mas não houve corte de salários no último dia 5.

Se não houver acordo na greve dos auditores, o julgamento do mérito do caso na terceira seção do STJ pode criar critérios sobre legalidade de greve de servidores - por exemplo, se é motivo para paralisação o não-cumprimento de acordo ou a não-equiparação com outras categorias. Podem sair ainda critérios sobre como deve ocorrer o corte de dias parados e se é possível haver poder "normativo" da Justiça em disputas com o setor público, determinando o cumprimento de reajustes salariais. Isto porque, na Justiça do Trabalho, na falta de acordo o juiz pode julgar o dissídio de greve, obrigando o empregador do setor privado a conceder reajustes.

Para o advogado especialista Roberto de Figueiredo Caldas, presidente da comissão de direitos sociais da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e sócio do escritório Alino & Roberto e Advogados, não haverá problema do ponto de vista jurídico para o STJ julgar um dissídio de servidor público, ao menos no governo federal. Segundo ele, em outras disputas o Judiciário já ordenou a aprovação de verbas suplementares, que devem ser encaminhadas pelo Executivo e aprovadas no Legislativo, e tudo correu bem. O problema pode ocorrer com governos locais que descumprirem recorrentemente decisões judiciais - como já fazem nos casos de precatórios. Para Caldas, haverá espaço é para a discussão do corte de dias parados, o que, na sua opinião, só pode ocorrer se houver lei específica aprovada para o setor público. Segundo ele, a corte superior da Espanha estava na mesma situação quando julgou uma greve de servidores em 1984, e decidiu ser impossível cortar dias parados se não houver previsão legal.
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