29 de Julho de 2008 - 15h:22

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Defensoria Pública e OAB-SP devem voltar a dialogar nesta terça-feira

Por: Última Instância

Mais de duas semanas após o início do impasse entre a OAB-SP (Ordem dos Advogados do Brasil em São Paulo) e a Defensoria Pública do Estado, ocasionado pela não renovação do Convênio de Assistência Judiciária, depois de várias manifestações, oriundas de ambos os lados, as partes devem voltar a dialogar nesta terça-feira, 29 de julho.

Estão marcadas duas reuniões, a primeira às 15h, no TJ-SP (Tribunal Justiça de São Paulo), requisitada pelo corregedor-geral de Justiça do Estado de São Paulo, Ruy Camilo, e a segunda às 16h, na sede do Conselho Estadual de Defesa da Pessoa Humana, a pedido do ouvidor-geral da defensoria pública, Willian Fernandes.

Consultadas pela reportagem de Última Instância, a OAB-SP, por meio de sua assessoria de imprensa, e a defensoria, na pessoa da defensora Renata Tibyriçá, confirmaram a presença nos dois encontros.

A reportagem também ouviu Willian Fernandes sobre o impasse. Em entrevista, o ouvidor disse que a principal preocupação da ouvidoria é com o usuário do serviço de assistência judiciária. “A solução para a crise deve deixar de lado as questões corporativas, seja da defensoria, seja da OAB-SP, e priorizar o usuário”, afirmou.

Sem intencionar levar em conta o aspecto jurídico da questão, Fernandes disse considerar relevante a medida, tomada pela defensoria, de convocar advogados para atuarem na prestação da assistência à população carente. A opção foi alvo de ação da OAB-SP no TCE (Tribunal de Contas do Estado).

“Sobre o ponto de vista político, considero que qualquer medida de urgência, não apenas essa, que vise não deixar as pessoas que precisam de Justiça desamparadas, seja relevante. Independentemente de se tratar de uma contratação direta de advogados”, disse.

Leia a seguir a entrevista:

Última Instância — Como o sr. tem acompanhado a crise decorrente da não renovação do convênio com a OAB-SP?
Willian Fernandes — Estava de férias quando o impasse teve início, mas, assim que fiquei sabendo, me interei dos acontecimentos numa reunião com a defensora-geral, onde todas as informações me foram passadas, basicamente, as que têm sido veiculadas pela imprensa. Também fiquei sabendo das estratégias da defensoria para dar conta desse problema. O nosso foco está nos efeitos que o problema terá para os usuários da defensoria e em se posicionar em relação a essa questão de maneira imparcial. Como o ouvidor é uma pessoa externa à carreira e que representa a sociedade civil dentro da instituição, a nossa intenção agora é discutir isso no seio da sociedade civil e extrair um posicionamento, o máximo possível unificado. Para isso, discutiremos a questão com o nosso colegiado.

Última Instância — Qual é a formação desse conselho?
Fernandes — São basicamente pessoas ligadas à sociedade civil, representantes de entidades de defesa dos direitos humanos, que têm dentre as suas atribuições, a defesa das pessoas necessitadas, assim com a defensoria.

Última Instância — Para o sr., qual seria o real motivo da origem desse impasse? Poderia ter relação com a qualidade do serviço prestado pelos advogados da OAB-SP, que poderia estar deixando a defensoria insatisfeita?
Fernandes — Não queremos nos pautar por um suposto descontentamento com a qualidade do serviço. O nosso posicionamento é que se deve investir na defensoria como o melhor instrumento de defesa das pessoas necessitadas. Esse é um posicionamento consensual, na medida em que a própria Constituição estadual aponta pela necessidade de uma estruturação de uma instituição vocacionada para a prestação de serviços de assistência judiciária. Independentemente dos trabalhos que são hoje prestados pela OAB-SP. Isso é uma outra questão que não estamos entrando no mérito. Mas o nosso posicionamento inicial, repito, é que se deve investir, cada vez mais, na defensoria pública como sendo o melhor instrumento de defesa das pessoas necessitadas.

Última Instância — Como será essa reunião convocada pelo sr.?
Fernandes — Para a reunião, chamamos tanto a defensoria pública como a OAB-SP, para que façam a sua exposição a respeito da questão. Cada uma das partes irá se pronunciar, o que deverá acontecer em momentos distintos, pois não desejamos estabelecer um debate para então nos posicionarmos em relação a essa questão. Feito isso, pretendemos debater, a partir da exposição das partes, para finalmente estabelecermos uma opinião sobre esse assunto.

Última Instância — Dependendo de como ocorra a reunião, o sr. cogita determinar a apuração de eventual conduta da defensoria de não renovar intencionalmente o convênio?
Fernandes — Não estamos ainda nos manifestando acerca desta questão, nem atribuindo à defensoria a culpa pela não renovação do convênio. Como também não estamos dizendo que a OAB-SP foi intransigente e aproveitou essa oportunidade para ter um aumento nos seus vencimentos. Temos o termo de convênio que será distribuído aos conselheiros e para outras pessoas da sociedade civil que não fazem parte do conselho, como a presidência da comissão de direitos humanos da câmara municipal, entre outras, que não fazem parte do conselho, mas que participaram da luta para a criação da defensoria pública. A idéia não é partir do princípio de que seja o culpado, mas buscar uma solução que não acarrete danos aos usuários que cotidianamente vêm buscar a defesa de seus direitos. Da forma como se encontra hoje, a situação é danosa. Isso eu penso ser pacífico.

Última Instância — A OAB-SP considera ilegal o edital lançado pela defensoria para convocar advogados, sem a intermediação da entidade, para a execução da assistência judiciária. Como o sr. avalia a pertinência deste edital?
Fernandes — Não temos feito uma leitura jurídica da questão. Temos acompanhado os acontecimentos de perto, todas as medidas implantadas pela defensoria para dar conta deste problema, mas não estamos procurando fazer uma leitura jurídica. Nós estamos fazendo uma leitura política, que seria a necessidade de se dar uma solução para a questão, independentemente do aspecto legal. Sobre o ponto de vista político, considero que qualquer medida de urgência, não apenas essa, que vise não deixar as pessoas que precisam de Justiça desamparadas, seja relevante. Independentemente de se tratar de uma contratação direta de advogados.

Última Instância — A OAB-SP tem manifestado, por meio da imprensa, que tem procurado o diálogo, mas a defensoria não estaria atendendo. Na reunião, o sr. pretende indagar quais os motivos para essa ausência de conversa?
Fernandes — Estamos deixando a reunião bem aberta, pretendemos que cada parte coloque todos os motivos que fizeram o convênio não ser renovado. Não pretendemos que o procedimento seja algo inquisitorial. A nossa intenção é buscar um posicionamento da sociedade civil sobre o tema. Repito, mas não será nada inquisitorial.

Última Instância — Quanto à informação, divulgada no Diário Oficial de sexta-feira (25/7), de que a defensoria estaria economizando R$ 272 milhões com o fim do convênio com a OAB-SP. O sr. acha que ela procede? Para que poderiam ser utilizados esses recursos?
Fernandes — Nós pretendemos discutir isso. Todos esses dados que a defensoria tem divulgado, inclusive o número de atendimentos efetuados desde o fim do convênio, pretendemos discutir. Bem como gostaríamos de ouvir a OAB-SP a respeito dos valores que a entidade tem afirmado ter gasto com o convênio, que supostamente deveria ser restituído pela defensoria. Com todos esses questionamentos, pretendemos extrair o pensamento da sociedade civil. É esse o foco.

Última Instância — A assistência judiciária é de vital importância para a população carente e, por meio do convênio, desempenhava-se boa parte desta atividade. Para os advogados que sobrevivem deste serviço, não é diferente. Diante disso, o que o sr. poderia dizer para essas pessoas que se encontram tão prejudicadas por essa crise?
Fernandes — Não diria para os advogados, mas sim para a sociedade civil. Tentaremos obter um posicionamento imparcial, que seja o mais benéfico para a sociedade que precisa de assistência. A nossa visão ainda não está nos profissionais que estão prestando o serviço. Sabemos que essa denominada crise tem gerado discussões acaloradas referentes tanto à necessidade de investimentos na defensoria, como também na suposta dependência de advogados para a sobrevivência por meio desse convênio. Repito, não é o nosso foco. A nossa prioridade são aqueles que precisam de Justiça, mas que não podem pagar advogado. A nossa missão é ouvir as partes e estabelecer um posicionamento em face dos usuários do serviço de assistência judiciária e não dos advogados e defensores públicos.

Última Instância — Então o sr. não considera a renovação do convênio fundamental?
Fernandes — A nossa maior preocupação não é a renovação do convênio, mas sim a prestação do atendimento à população carente, seja de que forma for. Resumindo, a nossa primeira preocupação é com o usuário, a posição a ser encontrada deve ser a mais benéfica para o usuário. Ressalto a necessidade de se investir na defensoria pública como melhor instrumento de inclusão, de educação e de proteção dos direitos daquelas pessoas que buscam atendimento jurídico. Este cenário, que seria o ideal, ainda não foi desenhado, por conta das deficiências da defensoria que depende do convênio para a prestação da assistência jurídica.

Última Instância — O que se pode fazer, enquanto isso não ocorre?
Fernandes — Enquanto esse cenário ainda não existe, temos medidas paliativas. A maioria dos convênios serve exatamente para isso. A própria Constituição estadual sugere uma medida paliativa para quando a defensoria não tem estrutura. A redação do artigo 109 sugere que a contratação de advogados é uma medida paliativa. Diante disso, penso que em primeiro lugar deva-se investir na própria defensoria. A solução para a crise deve deixar de lado as questões corporativas, seja da defensoria, seja da OAB-SP, e priorizar o usuário. E será nesse sentido a discussão de amanhã, que poderá, eventualmente, ser preparatória para outra que vise estabelecer um amplo diálogo com outros setores da sociedade.

Eduardo Ribeiro de Moraes

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