28 de Novembro de 2008 - 17h:29

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Capital externo volta, mas nada de festa

Por: Valor Econômico - Adriana Cotias

A alta do Ibovespa antes do feriado de Ação de Graças fechar Wall Street contou com a presença de um protagonista que nos últimos meses tinha assumido o papel de coadjuvante no mercado brasileiro: o investidor estrangeiro. Pelos últimos dados oficiais, na segunda-feira, quando o índice subiu 9,4%, entraram no pregão R$ 362,453 milhões, o que reduziu o saldo negativo do mês a R$ 1,815 bilhão. Na terça e na quarta-feiras, o capital externo seguiu lançando ordens de compras aqui e ali e há quem estime que o fluxo total tenha ficado próximo dos R$ 500 milhões nesta semana. Não é nada para soltar fogos, mas se esses dados se confirmarem novembro apresentará saídas líquidas na casa do R$ 1,6 bilhão, o melhor resultado mensal desde maio, quando ingressaram na Bovespa R$ 532,6 milhões. De lá para cá, a participação do capital externo no pregão caiu de 35,2% para 33,5%. No ano, a conta mostra ainda um imenso rombo, de R$ 24,849 bilhões até o dia 24, condição difícil de reverter mesmo que vingue a tese do rali de fim de ano. Não há ninguém muito convicto disso. 

Os planos de resgate dos Estados Unidos, Europa e Ásia e a definição do time que passará a comandar a economia americana quando Barack Obama assumir a presidência em janeiro melhoraram a percepção geral dos investidores, mas não é a retomada, diz o economista-chefe da Ágora Invest, Álvaro Bandeira. "São compras de ocasião, sem nenhuma grande consistência", afirma. "E depois de o Ibovespa acumular alta de quase 16% em quatro dias, com alguns papéis subindo até mais, isso chama vendas." Para o especialista, os planos econômicos que começam a ser colocados em prática dão suporte para investidores que tenham um horizonte mais adiante, entre 9 e 12 meses, já que há um claro "overshooting" (desvalorização excessiva) com oportunidades para todos os gostos: em ações cíclicas, como siderurgia, mineração e petróleo, além de bancos, papéis que compõem o conjunto de "blue chips" brasileiras. 

No curto prazo, porém, os investidores ainda vão acompanhar com os nervos à flor da pele os dados da economia americana - e global - referentes ao quarto trimestre. Por ora, as expectativas estão muito baixas e só a partir do segundo trimestre de 2009 é que vai ser possível ter a dimensão do freio na atividade e qual o horizonte de recuperação, diz a sócia-gestora da Global Equity, Patrícia Branco. "Os bancos centrais já mostraram que estão dispostos a qualquer coisa para salvar a economia mundial, para buscar o reaquecimento, há estrangeiros comprando ações brasileiras, mas a situação americana é ainda muito frágil", afirma. "O consumidor tem de ter confiança de que o dinheiro dele no Citi está seguro, de que vai conseguir pagar a casa, o cartão de crédito." 

Ela lembra que as vendas do varejo no "Black Friday", hoje, data em que o comércio dos EUA abre as portas com superliquidações, pode ser um termômetro do que virá pela frente. No meio da crise, alguns lojistas já vinham antecipando, porém, as promoções desde meados de novembro. Na bolsa brasileira, a especialista considera que as ações pertencentes à cadeia de commodities vão ainda se ressentir da queda da demanda global e que, num cenário de reação, são os papéis relacionados ao mercado interno, como bens de consumo e varejo que podem fazer a diferença. Tal leitura baseia-se num cenário de queda da Selic a partir do segundo trimestre de 2009, um pouco na contramão do mercado que vem projetando estabilidade ou até alguma elevação. A Global Equity projeta o juro básico brasileiro em 12,75% ao ano em dezembro de 2009.


Múltiplos baixos, e daí? 

Um claro sinal do quanto as ações brasileiras estão sobrevalorizadas é o múltiplo conhecido como Preço/Lucro - o valor de mercado em relação ao resultado e que dá uma idéia do prazo de retorno do investimento. Segundo levantamento da Standard & Poor's, compilado pela área de pesquisa da Planner Corretora, em outubro, o P/L brasileiro estava em 5,22 vezes, o mais baixo entre os emergentes, numa lista que inclui Rússia, Argentina, China e México. 

Isso indica que as cotações estão atraentes, há oportunidades ímpares, mas essa combinação está longe de encorajar compras. Pelas projeções da Itaú Corretora, o P/L das empresas brasileiras estimado para 2009 é de 4,3 vezes, ante 5,5 vezes de 2002 quando Lula assumiu a presidência e muito aquém da relação de 10,5 vezes do ano passado. A grande dúvida nessa equação é o "L", afirma o estrategista de pessoa física Flávio. Conde. "Será que os lucros projetados para Petrobras, Vale, bancos e siderúrgicas vão se realizar?" Por ora, ele diz que não dá para saber. Tudo vai depender de como e quando a economia mundial será reativada, a começar pelos EUA. O grande dilema é que as iniciativas para restaurar o crédito levam um certo tempo para chegar ao sistema. Não é isso, portanto, que vai mudar o curso do mercado por enquanto. 

Ontem, no meio do feriado americano, o Ibovespa recuou 0,70%, aos 36.212 pontos. O giro limitou-se a R$ 1,739 bilhão, muito aquém da média do mês, de R$ 3,807 bilhões. 

Adriana Cotias é repórter de Investimentos. 

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