05 de Dezembro de 2008 - 15h:58

Tamanho do texto A - A+

Reflita antes de trocar o fundo de renda fixa pelo CDB

Por: Valor Econômico - Rogério Bastos

Tem sido noticia constante na mídia a saída de recursos dos fundos de renda fixa e o aumento da captação em CDBs. Isto me levou a uma reflexão: se as carteiras dos fundos são compostas, em grande parte, por títulos de renda fixa como CDBs, debêntures e títulos públicos, por que os clientes se sentem mais seguros em aplicar em CDBs? A reposta mais comum: a insegurança causada pela marcação a mercado, que tem produzido efeito negativo sobre as cotas recentemente.

É importante dizer que a marcação a mercado foi implementada como uma forma de proteger o investidor daqueles que, em situações adversas de mercado, sacam seu recursos. Por meio dela, os ativos têm seu valor ajustado todos os dias para o preço justo, impedindo que o investidor que acredita e fica no fundo seja prejudicado. Ironicamente, esse mesmo mecanismo tem causado mal-estar justamente entre aqueles que são protegidos por ele. 

De forma geral, os CDBs e outros títulos comprados diretamente pelos investidores têm seu valor reportado pela "curva", ou seja, pelo valor teórico daquele dia. Assim, se um investidor precisar resgatar um CDB antes de seu vencimento, poderá se deparar, em situações de crise como a que passamos agora, com um valor bastante inferior àquele que ele vê em seu extrato. Aqui a máxima "o que os olhos não vêem, o coração não sente" me vem à cabeça. 

Para ilustrar, vamos imaginar que um investidor faça duas aplicações no dia 1º de janeiro: um investimento de R$ 100 mil em um fundo de renda fixa e a compra de um CDB com taxa de 12% ao ano, com prazo de vencimento de dois anos e valor inicial também de R$ 100 mil. Suponhamos, ainda, que o gestor do fundo no qual esse investidor aplicou compre o mesmo CDB descrito acima para compor a carteira do fundo e que, passados dois meses da data da aplicação, o Banco Central aumente os juros para 13,75%. 

No dia seguinte, ao examinar seu extrato, o investidor se depara com um valor aproximado de R$ 101.906 para o CDB e de R$ 100.049 para o fundo. Ou seja, existe uma diferença de R$ 1.857 (1,86%) entre as duas formas de cálculo, mas ainda estamos falando do mesmo CDB! Então, como explicar essa diferença? O fato é que, se o nosso investidor resolvesse utilizar o dinheiro naquele dia, o valor bruto que ele estaria recebendo em ambos os casos é o mesmo, cerca de R$ 100.049. Isso quer dizer que o valor reportado no extrato para o CDB não retrata o preço de venda do título e, sim, seu valor teórico, passando uma sensação de estabilidade que muitas vezes não condiz com a realidade. 

Além disso, imaginemos que junto com o nosso investidor houvesse outro com aplicações no fundo de renda fixa com o mesmo investimento de R$ 100 mil. Para este exemplo, vamos supor que nosso investidor permanecerá no fundo e que o outro resolverá sacar os recursos no dia seguinte à alta dos juros. Se a marcação a mercado não existisse e os fundos utilizassem o critério do valor teórico para calcular suas cotas, o investidor que sacou receberia aproximadamente R$ 101.956 quando, na verdade, sua parte só vale R$ 100.049 e o prejuízo que ficasse no fundo seria assumido pelo outro cotista. Parece justo? Não. Por isso a marcação a mercado é obrigatória em todos os países que têm um mercado financeiro desenvolvido, inclusive o Brasil, para coibir justamente situações como esta. 

Mas vejo muitos poupadores e investidores, incomodados com ajustes da marcação a mercado que já foram feitos, sacando recursos de fundos, recolhendo Imposto de Renda antecipadamente e comprando títulos com taxas inferiores àquelas dos papéis que compõem a carteira de seu fundo. Pior: ainda se sujeitam, na maior parte das vezes, a uma alíquota de Imposto de Renda maior no vencimento do título comprado. 

Admito que ver o valor de seus investimentos caindo traz sofrimento para boa parte dos investidores (me incluo no grupo). Porém, o mais importante é não deixar que esse medo o leve a tomar decisões sem que tenha refletido plenamente sobre as suas consequências. Assim, se você for investidor de longo prazo e o fundo em que você investe apresenta um histórico condizente com as suas expectativas, pense duas vezes antes de trocá-lo por um título ou CDB. 


Rogério Bastos é consultor financeiro e possui a certificação Certified Financial Planner (CFP) 

E-mail: rogerio@finplan.com.br 

VOLTAR IMPRIMIR