16 de Abril de 2010 - 12h:39

Tamanho do texto A - A+

Novos gestores no pedaço

Em quatro anos, mais de cem casas foram criadas, elevando o número para mais de 300, o que pode levar a uma nova consolidação.

Por: Alessandra Bellotto - Valor Econômico

Embalado pelos muitos anos de bonança, o mercado brasileiro de gestores de fundos cresce sem parar. Nem mesmo a recente crise financeira conseguiu brecar essa onda de expansão e, por que não dizer, de otimismo. Levantamento do Valor com base nos dados da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima) aponta que o setor ganhou mais de cem novas assets desde 2006, passando de 217 em dezembro daquele ano para 334 em fevereiro. Ao longo de 2008 - ano mais impactado pela turbulência global -, foram abertas 43 gestoras, entre elas assets importantes na cena internacional, como a americana Ashmore e coreana Mirae.

Os avanços do Brasil no campo macroeconômico - com controle de inflação, solidez fiscal, queda da taxa de juros - e, consequentemente, no mercado de capitais, estão no pano de fundo da forte expansão das assets. Os gestores enxergaram na busca crescente do investidor por alternativas de aplicação mais rentáveis uma oportunidade de negócio.

Foto Destaque

No ano passado, segundo relatório da Fitch Ratings, o crescimento de gestores ocorreu especialmente no segmento de fundos especializados, como multimercados e ações. E está em linha com a tendência de migração para fundos de maior risco e consolidação do setor de multigestores, que atingiu patrimônio de R$ 62,2 bilhões em 2009, aponta a Fitch. Além do espaço aberto para a oferta de carteiras diferenciadas, o país vem crescendo em riqueza ano a ano, destaca Carlo Moratelli, diretor de investimentos do "family office" Orey Financial.

Outro fator que estimulou o aumento dos gestores, segundo o executivo, foi a consolidação bancária, com o consequente enxugamento dos quadros de funcionários. "Sobrou muita gente boa no mercado." E, diga-se de passagem, com dinheiro no bolso. Esse é o tipo de profissional que não delega a gestão de seus recursos para terceiros, afirma Moratelli. "Se vão cuidar do dinheiro próprio, montar uma asset é um passo natural."

A barreira de entrada nesse mercado é nula, o que contribui para o surgimento de novos participantes, ressalta Gilberto Faiwichow, sócio da BRL Capital, asset criada neste ano em sociedade com Morris Safdié. "Como não há obrigação de capital para abrir uma asset, muita gente que viu o boom do mercados nos anos de 2005 a 2008 aproveitou para ter seu próprio negócio", diz. A BRL, contudo, nasceu para abrigar um fundo velho conhecido do mercado, gerido desde 2005 por Faiwichow. Trata-se do antigo multimercado Black River Yield, que depois virou Fidúcia Black Diamond.

Já a Kapitalo Investimentos começou em setembro pelas mãos dos ex-diretores do banco BBM - que vive às voltas com mudanças no comando desde 2006 - João Carlos Távora Pinho e Carlos Woelz. Depois de 12 anos de casa, ambos decidiram partir para voo solo. "Sentimos que havia uma demanda grande por fundos com retornos mais altos, dada a expectativa de juro mais baixo no médio e longo prazo", explica Távora Pinho, que tem mais de 30 anos de mercado, os últimos 12 no BBM nas diretorias de relacionamento institucional, captação e área internacional do banco.

E foi essa expertise que motivou a criação da asset, diz Pinho. "Apostamos na nossa capacidade de implantar um negócio bem estruturado, com pessoas experientes." O primeiro fundo da Kapitalo, que começa com nove profissionais, é um multimercado multiestratégia, com foco nos segmentos de moedas e juros. A carteira começou com recursos dos sócios e acaba de ser aberta para captação de terceiros.

No universo da renda variável, outra casa nova é a AguasClaras Investimentos. Seu primeiro fundo, uma carteira de ações, foi registrado no fim de setembro, mas a gestora já tinha ganhado o mandato de um investidor grande que tornou o negócio viável. O sócio-fundador é Thomas de Mello e Souza, profissional que ficou por dez anos na Merrill Lynch, inclusive no cargo de chefe do departamento de pesquisa de ações para a América Latina. Em 2004, assumiu como diretor na JSI Investimentos, "family office" criado para fazer a gestão dos recursos de Joseph Safra.

Ricardo Kovach, sócio da AguasClaras responsável pelas áreas financeira e de operações, enxerga um futuro bastante promissor para o segmento de fundos, especialmente de renda variável. "Olhando para o longo prazo, a tendência do juro é para baixo, o mercado de capitais vai crescer e o brasileiro vai passar a ter uma parcela maior de sua poupança em ações", afirma. Na visão dele, há espaço para butiques de investimento especializadas e tudo é uma questão de nicho. "São pouquíssimos os fundos quantitativos, e mesmo o segmento de ações tem oportunida-des." Disputar um mercado consolidado é mais difícil, observa.

Novos gestores vão continuar surgindo, especialmente os de nicho, acredita o diretor de investimentos do Credit Suisse, Glauco Cavalcanti. "Afinal, há mais papéis e histórias diferentes para comprar, e mercados potenciais como o de títulos corporativos", diz o executivo. A possibilidade de uma consolidação, no entanto, não está totalmente descartada. Cavalcanti diz que há um limite de capacidade nesse segmento.

Mas ele faz uma ressalva: "não é certo que dois gestores pensando a mesma coisa consigam maximizar os ganhos juntos, alguma consolidação pode acontecer, mas mais no nível operacional e comercial". Para o diretor do Credit Suisse, o que pode acontecer é uma asset independente complementando sua prateleira de fundos, acrescentando uma carteira quantitativa, outra de crédito privado.

Há quem olhe essa onda de crescimento com um pé atrás. "No período de bonança para os mercados, entre 2003 e 2007, houve um crescimento exagerado de novas assets, com característica de bolha", afirma o sócio da Modal Asset Management Alexandre Póvoa. Segundo ele, como o mercado ia para o mesmo lado, muita gente abriu asset pequena, que em geral tem dificuldade em se sustentar no longo prazo. Além de ser caro manter uma gestora com gente qualificada, área de pesquisa macroeconômica e análise, o mercado não será tão fácil daqui para frente, diz. "Sem tendências para os ativos, o ano de 2010 promete ser um dos piores desde 2002."

Para ele, é possível esperar um movimento de concentração de gestores nos próximos anos. "Vamos ver muita gente fechando as portas ou sendo comprada." Ele cita a volta do apetite de gestores estrangeiros por Brasil, interrompido pela crise. Goldman Sachs, J.P. Morgan e UBS são alguns exemplos. Também vale lembrar que, durante a crise, algumas assets sofreram, entre elas casas lideradas por ex-diretores do Banco Central. A Sekular se juntou à Mauá, de Luiz Fernando Figueiredo. A Ciano se transformou em Axio, com a saída de Ilan Goldfajn para o Itaú. A Mandarim foi absorvida pela Máxima, entre outros casos.

VOLTAR IMPRIMIR