30 de Janeiro de 2009 - 13h:18

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O governo, a crise e as medidas tributárias

Por: Valor Econômico - Maucir Fregonesi Jr.

Crises econômicas, como a que se iniciou nos Estados Unidos e na Europa e já produz efeitos sobre as economias emergentes, requerem uma atuação imediata e efetiva dos governos federais. De setembro de 2008 até hoje, sobretudo nos Estados Unidos, Europa, China e Japão, inúmeros foram os anúncios de amparo de bancos federais ou governos a empresas e instituições em dificuldades financeiras. 

No Brasil, o governo federal tem buscado acalmar o mercado, os empresários e os trabalhadores com discursos que enfatizam a necessidade de se incentivar a produção e o emprego, por meio de investimentos diretos - ou, pelo menos, a manutenção do orçamento já previsto em obras públicas -, subvenções financeiras ou redução da carga tributária de algumas atividades ou setores. 

No campo tributário, porém, além da redução da alíquota do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para alguns produtos, e da criação de alíquotas intermediárias para o Imposto de Renda (IR) da pessoa física, pouco se tem feito no propalado esforço governamental de contribuir para a minimização dos efeitos da crise mundial entre nós. Pior que isso. Com a edição da Medida Provisória nº 449 e da Instrução Normativa nº 900 pelo presidente da República e pela Receita Federal do Brasil, respectivamente, em dezembro de 2008, percebe-se nitidamente o intuito governamental de não avançar em instrumentos fiscais que, sem dispêndio de recursos públicos, poderiam se contrapor à atual crise de liquidez enfrentada pelas empresas, notadamente no campo da compensação tributária. 

Ora, como é sabido, a compensação tributária sofreu grande ímpeto após a edição da Lei nº 8.383, de 1991, cujo artigo 66 dispôs sobre a possibilidade de o contribuinte compensar créditos tributários detidos por ele com débitos vincendos de tributos. O parágrafo 1º desse artigo 66, todavia, impunha que a compensação só poderia ser efetuada "entre tributos e contribuições da mesma espécie". O debate na doutrina à época foi intenso, no sentido de se definir o que se deveria entender por tributos da mesma espécie: a compensação seria possível entre créditos e débitos de imposto e contribuições sociais, por exemplo, ou, restritivamente, apenas entre o mesmo tributo? A segunda opção foi a adotada pela Secretaria da Receita Federal na ocasião. 

Em dezembro de 1996 veio a Lei nº 9.430, e seu artigo 74, bastante festejado, pôs fim à discussão anterior, possibilitando a compensação de créditos tributários com débitos vincendos de qualquer tributo, desde que administrados pela Secretaria da Receita Federal. Posteriormente, a Lei nº 10.637, de 2002, alterou a redação do caput do artigo 74, viabilizando a compensação, inclusive, de créditos tributários oriundos de decisões judiciais transitadas em julgado. 

Pois bem. Com a integração do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) à Secretaria da Receita Federal, operada sob a égide da Lei nº 11.457, de 2007, pensou-se que o próximo passo da evolução normativa da compensação tributária seria permitir a liquidação de débitos vincendos dos demais tributos federais - como o Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ), a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) e a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) - com a contribuição previdenciária sobre a folha de salários, já que, atualmente, são todos administrados pelo mesmo órgão, a Receita Federal do Brasil. 

Tal necessidade, é bom que se diga, já era latente antes mesmo da deflagração da atual crise mundial, tendo em conta que muitas empresas de serviço sofrem a retenção de 11% sobre as faturas emitidas, a título de antecipação da contribuição previdenciária devida sobre sua folha de salários. Em muitos casos, porém, a retenção sofrida representa valor superior ao débito mensal que gera de contribuição previdenciária. A compensação desse crédito mensal com débitos vincendos de outros tributos federais seria uma alternativa ágil e segura de incremento à liquidez de empresas, que hoje dependem da tramitação demorada de pedidos de restituição. 

A Medida Provisória nº 449, porém, nada trouxe a esse respeito, e a Instrução Normativa nº 900 - editada, frise-se, especificamente para regular a restituição e a compensação de tributos federais - tratou de vedar, expressamente em seu artigo 44, a compensação de contribuição previdenciária com os demais tributos também administrados pela Receita Federal do Brasil. 

Poder-se-ia argumentar que a Instrução Normativa nº 900 teria feito melhor ao trazer todo um conjunto de normas para a restituição de tributos. Entretanto, entre os mais de 30 artigos que tratam da restituição, nenhum dispõe sobre o prazo em que o tributo pago a maior, inclusive via retenção, pelo contribuinte lhe será devolvido. Como se isso não bastasse, o artigo 29 da Medida Provisória nº 449 introduziu mais uma restrição às hipóteses de compensação tributária. Isso porque o novo inciso IX incluído ao parágrafo 3º do artigo 74 da Lei nº 9.430 eliminou a possibilidade de ser objeto de compensação com créditos fiscais as antecipações mensais de IRPJ e CSLL, para as pessoas jurídicas que adotam o regime anual de apuração do lucro real. Com isso, as empresas terão, efetivamente, que despender dinheiro do seu caixa para quitar débitos mensais desses tributos, apesar de possuírem créditos passíveis de compensação registrados em seu ativo. 

Nem tudo, nesse campo, está perdido: o Congresso Nacional, ao menos na tramitação da Medida Provisória nº 449, poderá propor emendas ao seu texto original. É aguardar para ver. 


Maucir Fregonesi Jr. é advogado especialista em direito tributário, planejamento tributário, tributação internacional e contencioso tributário 

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